Páginas

quinta-feira, 12 de maio de 2016

O QUE DEU ERRADO NO GOVERNO DA PRESIDENTE AFASTADA DILMA ROUSSEFF

Especialistas em administração pública, economia e política apontaram para as principais falhas da presidenta afastada.

Carisma de Lula beneficiou sucessora no 1º mandato, avalia cientista político

1. Economia
As acusações que embasam o pedido de afastamento de Dilma – as "pedaladas fiscais" e a assinatura de decretos de suplementação orçamentária sem a autorização do Congresso – refletem, de certa forma, a crise econômica que afeta o país.

Revelam as dificuldades que o governo enfrentou para fechar as contas públicas em um momento de baixíssimo crescimento ou, como agora, de recessão.
Segundo João Luiz Mascolo, professor de economia do MBA do Insper, Dilma errou ao não entender que a taxa de crescimento sustentada do país, ou seja, aquela que é possível manter por vários anos consecutivos, é de cerca de 2% anuais. E isso remonta ao governo Lula.
Para criar um "surto temporário de felicidade" em prol da candidata à sua sucessão, avalia Mascolo, o então presidente adotou uma série de medidas de estímulo, levando o PIB (Produto Interno Bruto) a crescer 7,5%, índice comparável ao da China, em 2010.
"Dilma pensou que isso era uma coisa permanente, e não temporária. Que bastaria fazer o que Lula fez para elegê-la, que o país ia crescer 7,5% todo ano, o que é um baita equívoco. A nossa taxa sustentada é 2%. Se você cresce 7,5% num ano, obviamente que os anos pela frente serão ruins."
Ao tentar repetir como "uma receita de bolo", a petista "disparou a inflação, que bateu 11% no ano passado, estourou a conta corrente e as contas externas", continua Mascolo, que aponta as sucessivas reduções da taxa básica de juros no início do governo dela como o "início do fim".
Dilma aumentou os gastos do governo e "comprometeu totalmente as contas públicas" para tentar estimular a demanda privada, conclui. "A prova é que a gente perdeu o grau de investimento: a trajetória de dívida/PIB é explosiva."
Já Bruno De Conti, docente do Instituto de Economia da Unicamp, vê "certo exagero" em dizer que o governo gastou demais.
A dívida bruta brasileira cresceu, na sua avaliação, por causa dos repasses do Tesouro ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para dar crédito barato às empresas e das perdas ocorridas, após a disparada do dólar, com os leilões de contratos de swaps cambiais (instrumentos que equivalem à venda futura da moeda americana, usados para conter a desvalorização do real e dar estabilidade ao mercado).
Ele vê três razões principais para o fracasso econômico – e, diferente de Mascolo, não coloca todas na conta de Dilma.
A primeira delas é o cenário internacional. Como o Brasil é "muito dependente" do que ocorre no exterior, ainda é largamente afetado pelo movimento no preço das commodities (matérias-primas), explica. "A gente viveu a bonança oriunda desse boom externo, mas vive agora o efeito contrário. Não temos a resiliência que se julgava em relação à crise."
Como segunda, elenca o que vê como erros da política econômica: segurar investimento público e "estender o tapete vermelho" para o privado com as desonerações (reduções de impostos) a determinados setores, com pouco retorno.
O terceiro aspecto, afirma, são os problemas estruturais que não foram resolvidos desde os governos anteriores e, em alguns casos, "podem até ter sido aprofundados" sob Dilma, como a fragilidade da indústria.
A época de real forte, diz, foi prejudicial à competitividade do setor, levando a uma alta importação principalmente de bens intermediários, como peças.
Assim, foram criadas lacunas na estrutura industrial, levando o crescimento registrado no governo Lula a "vazar para o exterior". Ele explica: a demanda aquecida alimentou a indústria externa, como a chinesa, em vez de diversificar a nacional.
2. Política
O cientista político Milton Lahuerta, professor da Unesp, evoca o clássico livro político O Príncipe, de Nicolau Maquiavel (1469-1527), para descrever o desempenhos ruim de Dilma na área política.
"Maquiavel diz que o pior tipo de principado é o herdado. Por que o príncipe não teve 'virtù' (em linhas gerais, qualidades pessoais) para conquistar o principado. Ele foi beneficiado pela 'fortuna', pela sorte", diz.
"Por que é o pior tipo de principado? Porque vai ser marcado pela instabilidade, já que diante da crise o príncipe não saberá como agir. Ele não foi preparado para isso, não conquistou sua sabedoria ao conquistar o poder."
Para ele, esse é o "nó inicial": Lula "criou" a sucessora. "Dilma não tem vida própria como política."
A petista se beneficiou das boas condições que permitiram o sucesso do segundo governo Lula, bem como do carisma do antecessor, continua Lahuerta. Mas, ao se reeleger, encontrou um país dividido e uma problemática agenda de ajuste fiscal, o que "exigiria mais habilidade do príncipe, no caso a princesa".
Ele lista uma sucessão de erros a partir daí:
"Primeiro, Dilma tentou reafirmar sua autonomia em relação a Lula. De outra parte, isolou o (vice Michel) Temer. E, cercada por trapalhões na operação política, quis criar um novo partido, com Cid Gomes e Gilberto Kassab, para esvaziar o lado fisiológico do PMDB, em vez de iniciar uma negociação para colar mais a legenda politicamente a seu governo. Como se o PMDB fosse ficar quieto", diz, sobre a tentativa frustrada de recriar o PL.


Nenhum comentário:

Postar um comentário